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Se você, que abriu e leu esse livro até aqui e ainda não levou um balaço no peito, então considere-se uma criatura de sorte: tem o  corpo fechado. Dê-se por satisfeito, pois sina adversa tiveram muitos personagens que povoam os caminhos da trama que se arma à sua frente. Alfredo Gonçalves de Lima Neto, o escritor, não o adverte dos perigos, entretanto, logo no início lhe dá o mote: “E os matara quando, justamente, o destino conspirava contra ele.”

O assunto dessa leitura trata da paciência assassina das tocaias nos ermos ásperos do sertão. Cuida, em uma escrita quase gongórica, dos mundos dentro dos homens, seus acertos e contradições, da brutalidade e não reserva a menor trela ao delicado, e quando o faz, é ao feitio das flores dos cactos: armadas de espinhos. O mundo que cerca os homens, Lima Neto o descreve como pano de fundo para o desenrolar da peça grega trazida ao ermo das grotas perdidas nos recolhidos e abrasantes do Nordeste.

A fatalidade de um destino imutável dentro da estrutura rígida sertaneja, representada no palco que terão que desempenhar, mostra aos homens seus papéis, trágicos e espelhados na realidade que os rodeia e a única escapatória é seguir vivendo, tirando a força que vem da terra e que molda o caráter peculiar de cada um e cada um é, per si, um ser comovedoramente ambíguo, forte e frágil, ante as vicissitudes que o cercam. Assim é o sertanejo que trafega pelas páginas de “O homem da lupara amarela”, sem se dar conta do épico heroísmo que o anima e o esmaga.

Pois dentro desse quadro de espetáculos e de tragédias, Lima Neto trouxe à baila o horror de “Édipo Rei”, quando Sófocles impingiu a Édipo, filho de Laio e de Jocasta, a culpa imperdoável que o consumiu na escuridão dos deserdados.

Se você chegou até aqui e ainda não levou um balaço no peito, prossiga, você tem o corpo fechado.

 

Carlos Magno de Melo

­ escritor